domingo, 28 de setembro de 2008

Gris Gsid


O erro no título está na palavra Gsid, devia ser Gris. Claro, Dr. John. Gris Gris Gumbo Ya Ya. Já ouviram? Beleza total. Dançável em serenidade. Estou com sono e tenho uma mão a apertar o exó-fago. Exó-fago é aquele que come o exotérico. Ugh! Trocadilhos de pacotilha. Como dizia, estou com sono e pouca energia, e Gris Gris Gumbo Ya Ya é como uma mãe que nos embala no nosso sono, é muito bom. 
Agora já é o Monk Monk's Mood, a oração de Coltrane, discípulo aqui, mas mestre. E já me sinto mais bem disposto, pelo menos a semana que vem já começa a ganhar forma na minha cachola. Em relação ao erro Gsid, fez-me lembrar Syd Barrett, e micofilias diversas.
O grande músico Cornette Holeman esteve em Veneza (palácio Gatti) onde, com o seu quarteto mais recente, musicou o ritual de Iniciação/Expulsão do nível XXIII da A.A. ou Illuminatus, ou Refluxus, ou Eris, ou o que quiserem, onde, entre outros notáveis, estava presente Aleph Trance, que liderou o Combóio Mágico  que deu algumas voltas à sala de audiências aonde Claudio Merulo inventou as suas Invenções, no órgão que ainda lá se encontra (não há caruncho em Veneza). Heinzkarlo soube que Ali Hassan também lá estave, e outros directores de corporações mais ou menos Illumináticas no seu funcionamento. 
Morreu Mauricio Kagel e o mundo ficou ainda mais pobre do que já estava. Estamos a chegar ao lado direito da Gaussiana da música erudita escrita actual. Embora proliferem as instituições dedicadas à música contemporânea pelo Ocidente, a realidade é que é muito pouca a música escrita que não é funcional, ou seja, é rara a música que não é um exercício intelectual  feito com o objectivo de obter uma bolsa. Os grandes desapareceram. Stockhausen, Ligeti, Xenakis, Berio, Nono, e agora Kagel...eles não compunham para obter uma bolsa. As bolsas existem por causa do trabalho que eles fizeram nos anos 50, 60, 70...a música não tem objectivos burocráticos, é feita para se ouvir. Há que saber ouvir, claro...em resumo: poucos são os compositores actuais de interesse, e de qualquer forma a este imbecil local à beira-mar plantado, sim, plantado porque se trata de uma planta, um vegetal, a este burgo, digo, a música de jeito não chega. Contudo, na santa terrinha a "música Contemporânea" existe...mas ninguém percebe nada: ninguém sabe se é bom se é mau, se um gajo toca um quarto de tom acima, vulgo desafina, ninguém se apercebe, não há qualquer nesga de apreciação musical, e pensando bem, ainda bem...porque se começarem a "ensinar" nas escolas a apreciação musical então é que vai ser o descalabro. Já estou a ver algum totó empertigado, gordo e com uma camisola de lã castanha com as golas a sair azuis, com um ar de quem tem um tubo enfiado no cú, um merdoso, portanto, a dizer às criancinhas o que é que hão de gostar...o professor é um ignorante musical e lá no fundo sabe-o, mas recalca, só que a sua frustação vem ao de cima em comportamentos fascizantes de cariz sexualizante (ele baba pelos cantos da boca quando mostra discos do Vim Merdens às alunas boas) e assim cria uma geração de pessoas horripiladas e desconhecedoras...a vida é bela! Agora junto Euro e vou ver concertos a Bruxelas. Crrrrrr! Para quê observar a Orquestra Metropolitana a massacrar alegremente tudo e mais? Eles tocam tudo: ele é Wagner na segunda, Mahler na terça, Stockhausen na quarta (com bois a rodar potenciómetros para a esquerda e a direita), anona de Beethoven na quinta, e na sexta Luis Re-presas (sinfonia "Bolacha" em fuck Menor) e depois vamos todos para o Lux abanar o capacete e tentar seduzir a gaja do fagote! 
Agora Thelonious toca Bye-Ya e assim me despeço até a la proxaine: Bye-Ya!   

domingo, 29 de junho de 2008

Novo momento

Heinzkarlo, cercado de familiares, actualiza, em alegria, o seu blog! Sim, porque o que é um blog não actualizado? Nada! Apenas um conjunto de aforismos desactualizados. Assim, e no interesse de acompanharmos os movimentos da humanidade, trago uma pequena reflexão sobre as últimos acontecimentos em Siwa: o sacerdote Eyeh, chocado com o comportamento do grande Alexandre, que bebeu cambaleante uma taça de vinho no átrio do edifício central do oráculo, secretamente introduziu no corno direito da coroa oferecida ao conquistador um pedaço de papiro com a inscrição "Não do deus mas do boi". Vinte anos mais tarde maçaria infindas vezes os familiares com esta história. Muitos não a compreendem. Mas poucos compreendem Siwa.
Um abraço Heinz

sábado, 29 de março de 2008

Matriz de Rotação


Tarde mziana Heinzkarlo deseja ao leitor! Mziana como em estar no Driss em Essaouira a comer bolinhos e chá, mziano de olhar para a Kasouba de Chaouen, ou o superlativo mziano bzereref de mini hamburguers de carneiro em pão discóbolo Magrebino, tudo ao aroma de sândalo por dignos Xerifes projectado em braseiras dispersas pelo campo!

Sim, hoje é um desses dias. Heinzkarlo dispôs-se com amigos numa circunferência de reunião pela madrugada, amplo e pequeno almoço engoliu e Calor em Lata ouve, numa partenogénese feliz de livres associações.

Neste auspicioso dia, é proposta a Hein a seguinte reflexão: alguma vez o leitor vibrou ao ouvir a música de Schoenberg? Se tal nunca acontece, não há problema: basta praticar! Ponha um disquinho do Antão (por exemplo as 5 peças para orquestra op.16) e faça de conta que está a ouvir AC-DC, abane o capuccino! Isto porque há música cuja audição deve ser praticada! Ao contrário do que a escola intuicionista de Pamela Margot e outros afirma, existe uma coisa que é saber ouvir!

Por exemplo, aos 3 minutos da acima referida obra psicadélica de Blues (qual? hehe) Heinzkarlo pasma-se perante a seca bateria, o que aumenta localmente no espaço-tempo as fronteiras conceptuais de Karlito! Repare: é bom aumentar o volume da nossa fruição artística. O que não quer dizer ouvir Toy (o Bach pimba). É uma arte, ouvir...

Quem acha que sabe ouvir e gosta de "primeiras impressões" deve ter cuidado para, com o tempo, não se transformar num ovinho ridículo de parolos paradigmas. Aprecie a segunda impressão, aprecie mesmo a sua impressão de ordem n! Vista um Zoot Suit, ponha um Schoenberg e abane as ancas, numa hierática atitude centro-africana!

E, se puder, vá comer um bolinho ao Driss. Um abraço aos amigos Khemadja.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Simeon Le Bon


Ontem, Heinzkarlo foi ao Bairro Alto ver o concerto dos Silver Apples. Mais precisamente: o sobrevivente, Simeon, e a sua parafernália de instrumentos electrónicos artesanais. Muitissimo bom...citando imprecisamente Brahma Dionysos (também presente no concerto): "De vez em quando é preciso vir cá um dos gajos velhos para vermos como é que se fazem as coisas". Simeon é um velho freak/hippy dos sixties, mas vê-se a inteligência, o trabalho...a vida. Uma vida dedicada a um estilo de música absolutamente poético e original. E o bom gosto. Belíssimos samplings. Grandes ritmos, melodias subtilmente atonais e minimais, a voz crua de Simeon...parecia a execução de um ritual de uma religião em desuso...por detrás de tudo, a felicidade em tocar, a simplicidade do gesto de quem é natural no que faz...algo de criança naquele velho feliz. Um grande à vontade...foi um bom momento. O homem mexia-se de uma maneira interessante, um corpo seco e compacto oscilando com as sinusóides num eixo horizontal. Inspirador...Heinzkarlo, e os seus músculos contraídos na procura da transcendência, agradeceram.

terça-feira, 4 de março de 2008

Buddy

Não sabia quando escrevi o texto anterior: Buddy Miles morreu a 26 de Fevereiro passado. O pai dele, George Miles Sr., tocou contrabaixo com Duke Ellington, Count Basie, Charlie Parker e Dexter Gordon. A alcunha "Buddy" vem do grande baterista de jazz Buddy Rich. O baterista Jack de Johnette conta que circa 1970, Miles Davis dizia-lhe: "toca como o Buddy Miles". Quando perguntaram a Buddy como queria ser lembrado, respondeu: "The baddest of the bad. People say I'm the baddest drummer. If that's true, thank you world". Era um mestre. Rest in Peace, brother.

sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

They don't know like I know

Band of Gypsys é um grupo constituido por: Jimi Hendrix, guitarra; Billy Cox, baixo; Buddy Miles, bateria. Quem ouvir este grupo, especificamente os álbuns "Band of Gypsys" e "Hendrix live at the Fillmore East" poderá notar que:
1 a) Hendrix não toca notas, toca energia. Isto é evidente, por exemplo, no primeiro solo de "Who Knows" (Band of Gypsys). É claro que toca notas, mas as notas são muito mais que simples frequências. Não começam nem acabam. Não são fixas, são vivas. Cada nota é um ser vivo de grande complexidade. O som fervilha de energia. Energia em cada nota, energia a ligar entre si todas as notas, o som é energia. Daí não fazer sentido, realmente, falar em notas. Não faz sentido dizer que o solo é composto de 137 notas. É como dizer que o mar é composto por 137 ondas.
1 b) Energia não quer dizer barulho ou tocar alto. É uma propriedade intrínseca à vibração e à vida. Os compositores que abarcam esta perspectiva na música geralmente falam em música espectral. Hendrix é um mestre da música espectral. O som dele tem dimensão infinita, tem infinitos graus de liberdade.
1 c) E a maneira como ele faz a guitarra cantar em uníssono com a voz, mantendo o acompanhamento (2 guitarras em 1)?
1 d) Esta é uma música assumidamente experimental (Hendrix diz ao público várias vezes que as músicas são experiências para ver o que acontece). Verdade seja dita: a voz de Hendrix não está muito bem. É algo que ele iria trabalhar mais tarde. Mas quer-se lá saber da voz...
1 e) Um espectador deve ter sido Miles Davis. Ouçam Jack Johnson, Agartha, Pangaea...tudo sob o signo Hendrix. Exemplo :"We Gotta Live Together"(Live at the Fillmore East). Parece o Miles Davis em 71/74.
2 - Buddy Miles é um baterista para bateristas (presumo, não sou baterista). Quem não perceber o que se passa, ouve-o e diz: "Parece um metrónomo, é sempre igual, é quadrado". Quem tiver uma vaga ideia do que se está a passar, não diz nada, ouve. Quando muito, escreve: Buddy Miles é iniciático. Quem souber ouvir cai para o lado de espanto. É a mesma coisa: cada batida que ele dá está viva...é um baterista absolutamente não linear e imprevisível. Ouça-se a bateria em "Power of Soul" (Hendrix live at the Fillmore East). O que eu quero dizer é: ouça-se a bateria em "Power of Soul". Ouça-se, por exemplo, como ele usa os pratos. Ouça-se o ocasional break que ele faz, em particular o segundo break, quando os outros param de tocar...esse break é uma das razões porque a vida é bela! É uma impossibilidade possível! E a voz dele? Como ele canta enquanto toca (Who Knows)!
3 - A propósito da parte de Who Knows em que o Buddy Miles canta, ouça-se, nessa mesma parte, o baixo do Billy Cox. Hendrix está silencioso nesta secção. Ouça-se esta secção rítmica, e perceba-se porque é que o maior guitarrista rock de todos os tempos a escolheu.
4 -Machine Gun é o grito contra a guerra do Vietname, contra a opressão, é a morte desesperada do idealismo dos anos 60. A versão do album Band of Gypsys contém aquele que provavelmente é o maior solo de guitarra eléctrica alguma vez realizado.
Em resumo: Band of Gypsys é o maior trio de rock de todos os tempos. Se pudesse viajar no tempo, só uma vez, para ver um concerto qualquer, ia sentar-me na primeira fila do Fillmore nos dias 31 de Dezembro de 1969 e 1 de janeiro de 1970 para ver e ouvir os 4 concertos deste grupo. Mesmo em frente ao Jimi.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Curso 10

No outro dia passaram por cima de Heinzkarlo dois F-16, aqueles aviões do exército que de vez em quando se estatelam no chão e cujo preço unitário é superior ao do túnel do marquês. Foram comprados aos EUA em conjunto com um carregamento de pastilhas elásticas Gloxy e uma selecção de ténis Nike para o chefe de estado maior das forças armadas. Estes aviões foram mandados na forma de um kit com instruções tipo "faça você mesmo". Naturalmente, alguns sucumbem à lei da gravidade. As instruções são extensas e depois do intervalo para o almoço o pessoal pode confundir alguns chips.
O som produzido por estes aparelhos ao passar é lindíssimo. Não vale a pena gravá-lo, é um som espacializado, uma vez que os aviões passam muito depressa. É um som cósmico, extenso, profundo, belo. Faz lembrar a obra Hymnen de Stockhausen. Heinzkarlo sacudiu uma molécula de Karma do ombro esquerdo só por causa deste som. É o último som que muita gente por este mundo ouve, antes de lhe cair uma bomba encima.
A beleza deste som vem de mão dada com a sua exorbitância...é um som raro e caríssimo! Estes aviões são a prova de que a arte é valorizada em Portugal...Hip! Hip! Hu hu hu

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Cosmic Jilala


De acordo com o Samkhya, um dos seis darshana, ou pontos de vista, do pensamento Hindu, o universo manifestado é o culminar de uma gigantesca sucessão de manifestações. Cada objecto de um universo contém na sua essência um outro objecto que se manifesta nele. Por exemplo, uma cadeira de madeira contém a árvore que lhe deu origem, árvore essa que contém na sua essência a semente que deu origem à árvore, etc. Quando se fala em objectos, não tem necessáriamente que ser objectos físicos, podem ser pensamentos, imagens, sons, emoções, sensações tácteis, cheiros, sabores...
Andando para trás nesta sucessão de manifestações, chegamos a um princípio comum a todos os objectos, princípio esse imortal e uno.
Muitas acções físicas são manifestações de algum pensamento. Neste sentido, muitos pensamentos são mais reais do que muitos actos, já que se encontram mais próximos do princípio imortal e uno. A imaginação de uma cadeira é mais real que essa cadeira, porque está antes da mesma.
Neste sentido, quando Heinzkarlo fala da Confraria Inominável, descreve objectos bem reais. Esta confraria é composta por músicos extraterrestres, extra-via-lácteos, mesmo, que se deslocam por este universo a tocar em diferentes planetas. Possuem uma panóplia imensa de instrumentos, organologia cósmica, por assim dizer, que lhes permite tocar em diferentes atmosferas. O zunir, por exemplo, é uma trompa que não produz qualquer som neste planeta, mas belos sons em exóticas atmosferas (por exemplo Betelgeuse 2). Outros instrumentos da Confraria Inominável têm nome, mas a estrutura vocal humana não permite a sua pronunciação.
Estes músicos induzem transes diversos nas diferentes raças que encontram, incluindo: transes de possessão, transes transcendentais, transes intergalácticos, distorções no espaço-tempo, projecções, mortes e ressureições, etc.
Os Confrades Inomináveis vivem no espaço-tempo sem os constrangimentos dos humanos, que só se deslocam livremente no espaço, e não no tempo. Isto tem a ver com a estrutura do cérebro humano, e a maneira como este apreende o espaço-tempo. A expressão espaço-tempo é muito aristotélica: na realidade, não é possível dissociar a consciência do espaço-tempo. Ora, a consciência dos Músicos Cósmicos permite-lhes deslocarem-se no tempo. Assim, passado e futuro, para eles, são como esquerda ou direita, fora ou dentro, para nós. Nisto eles são como os Trafalmadorianos, descritos e estudados por Kurt Vonnegut na obra-prima Slaughterhouse 5.
Eles interessam-se por nós porque nós somos os grandes explicadores, temos noções estranhas como a de livre arbítrio...eles não sabem o que é isso. Deslocam-se calmamente ao passado e o futuro, sabem tudo o que aconteceu e tudo o que vai acontecer...sabem como este universo acaba: o fim deste universo acontece quando os Trafalmadorianos experimentam um novo combustível. Um piloto de teste carrega num botão e este universo acaba (ver Slaughterhouse 5).
Quando vem tocar à Terra, a Confraria Inominável procura induzir nos humanos um transe de desbloqueio temporal, algo que nos faça viajar no tempo. Mas sabem que conhecer o futuro, para um humano, pode ser traumático. Assim, escolhem uma selecta audiência de gente iluminada. Siddhartha Gautama ouviu a sua bela música nas margens do Ganga. Alguns profetas não aguentaram os sons libertadores...basta ler o Apocalise. O homem passou-se! De facto, a estrutura do cérebro humano, nomeadamente a noção do eu, dificultam a integração de realidades futuras como a morte, ou sabermos que no futuro vamos ser carecas, ou racistas, ou do Benfica, ou alguma outra particularização cósmica.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Mra!

Ontem o túnel da realidade de Heinzkarlo intersectou a música "Mra" do grande grupo Brotherhood of Breath, liderado pelo músico sul-africano Chris McGregor. É um formato big band de influência africana intensa. Os músicos são os mestres do jazz sul-africano: Diyani, Feza, Pukwana...muitos metais: trompetes, saxofones, trombones. Ritmo, ritmo. Os trombones tocam uma pequena frase, nem chega a melodia, uma frase repetitiva que inclui uma terceira maior ascendente ligeiramente aumentada de um quarto de tom...este intervalo musical colocou Heinzkarlo num discreto transe que se prolonga para o dia seguinte...hoje! Assim, com esta música veio, por meio da deliciosa frase dos trombones, um conjunto de imagens do grupo Brotherhood of Breath a dar concertos, em manifestações supremas de Shakti musical. Alegria, dança, expansão, energia, vigor, luz, riso, loucura. Tanto, num intervalo de terceira maior acrescido de um quarto de tom! Heinzkarlo experimenta no seu ser os efeitos dos antigos modos gregos...já o musicólogo Edgar Elgar chamava a atenção para este facto: os modos gregos são mais vivos do que se pensa. Dizer que os modos gregos correspondem às teclas brancas do piano (dó a dó, ré a ré, etc.) é uma simplificação abstracta desprovida de prática. Nas palavras de Venâncio Paganini: "Saber sem experiência é gelo fino".

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Om Namah Shivaia


Limarco de Susa, filósofo da escola Pitagórica, é conhecido por ter sido, provavelmente, o pior aluno de Pitágoras, que o expulsou da sua escola ao surpreendê-lo, um dia, embriagado, a fazer glissandos obscenos na lira monocórdica do mestre enquanto cantava a canção popular da época "Selene vem ao prado comigo". Echecrates, outro aluno de Pitágoras, refere na sua panaceia que Limarco "...comia feijões com deleite, e fumava ervas, advogando o mergulho na dualidade como condição prévia para o logos."
Pouco mais se sabe sobre Limarco, a não ser que, aparentemente, tinha o dom da abiquidade, ou seja, o dom de não estar em nenhum lugar num dado momento. A abiquidade é um dos fenómenos interessantes da época, tendo até Ameinias comentado, no seu principia finis, que a verificação deste dom é extremente difícil; de facto, é quase impossível provar que alguém não está em nenhum local. De acordo com este autor, a única maneira de o fazer seria arranjar alguém com o dom da ubiquidade, para cobrir com a sua visão todos os pontos do mundo, e verificar que o sujeito não estaria, realmente, em nenhum local (este é o chamado Teorema de Ameinias). Assim, a abiquidade aproxima-se do milagre da divisão dos pães, frequente na antiguidade clássica, em que géneros alimentares (tipicamente, pão) são reduzidos drasticamente em número. Nas margens do lago Tiberíades, Asdrúbal, o louco, reduziu as reservas de pão de um conjunto de peregrinos a Siwa à sua décima parte, tendo sido linchado sumariamente.
A razão porque a abiquidade se aproxima da divisão sos pães é que muitas vezes o que acontecia era que os pretensos milagreiros simplesmente roubavam os géneros.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Teorema de Pitágoras

Chegou-me uma encomenda de discos do Stockhausen. São obras recentes, de 2005 e 2006: Naturliche Dauern, ou Durações Naturais, para piano; Cosmic Pulses, música electrónica; Freude, Alegria, para 2 harpas. O que mais me toca nesta música é uma qualidade bem expressa pela palavra inglesa otherness. Não é só questão de serem originais no contexto da Música. São originais mas além disso exprimem manifestações do Outro, do Intangível.

No outro dia fui ver com a Vanessa Champallimaud um concerto da banda Hermes. É uma banda ecléctica, que tanto toca música na veia de Sun Ra ou Bernhard Lang, como Rock, Blues ou outros ritmos. É composta por guitarra, baixo, bateria, sax tenor, sax barítono, trompete, e um coro de 3 babes, as Hermesetas. Gostei particularmente do ska com refrão

Yab Yum, Kangi Ten
Yab Yum, Kangi Ten
Yab Yum, Kangi Ten
Give me your love baby if you can

Fartámo-nos de dançar, inclusivamente ao som de música electónica ultra-dissonante.

Devo dizer que o conceito de ultra-dissonância é um pouco o Yin aonde a ultra-consonância será o Yang. Pode-se argumentar que nenhum destes dois conceitos faz sentido, mas não deixam de ser conceitos interessantes por isso.

Poderiamos pensar que o efeito físico que tem no ser humano a audição de um intervalo, por exemplo, de quinta perfeita - o que produz a sensação agradável de consonância - poderia ser intensificado, possivelmente em algumas condições atmosféricas ou psicotrópicas. Este efeito seria a sensação de ultra-consonância, o que faria do intervalo ouvido nesta situação um intervalo de quinta mais que perfeita. Pitágoras não gostaria, é certo. Mas o filósofo já sabia que a raiz de 2 não é um número racional, portanto talvez não se incomodasse tanto assim...

Depois do concerto fomos jantar javali ao Adro.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Sidi Baqal

Há uns tempos, iamos eu, a Karima e o Mukhtar a passear de carro, entre Jajouka e Chefchaouen. O objectivo era comprar jelabas, que as há em Chaouen de boa qualidade, boa lã.

A estrada tinha (e tem) trechos bastante maus, chegando mesmo a não existir estrada de todo. Assim, andavamos bem devagar, o que era bom para ver as belas vistas.

Quando passamos perto de uma certa aldeia, o Mukhtar disse:

- Ali era a festa do santo Abdellah Baqal. Os musicos costumavam ir lá tocar.

Como me interesso pelas origens e tradições das músicas das confrarias místicas de Marrocos, nomeadamente a de Jajouka, perguntei logo:

- Ai é? Já não existe essa festa?
- Já não, a confraria de sidi Abdellah Baqal já não existe. Acabou hà uns 30 anos. Mas nós muitas vezes tocavamos com eles.

Nesse momento, visualizei músicos, vestidos com jelabas castanhas e turbantes brancos de pano, tocando rhaita, sentados num círculo. Seriam perto de 10. Tocavam uma música muito diferente da de Jajouka, feita de longas suspensões e belos ornamentos na mudança de notas. O temperamento destas músicas não tem nada a ver com o temperamento igual, produzindo belos intervalos. O intervalo de terceira menor descendente tocado por estes músicos, polvilhado de um trilo, era maior que o standard, belo, mágico.

Na verdade, não me lembro se o nome do santo era Abdellah, mas tenho a certeza que o apelido era Baqal (com qof). Hei de perguntar ao Bachir.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Miya Rhaita, miya Tbila

Uma boa tarde, uma boa manhã.

O professor Bonga Brahms, do IST, teve o cuidado de me chamar a atenção para o facto de que o culto à deusa Astarte existiu, comprovadamente, em Cartago. Foi adorada em conjunto com a deusa Tanit. Agradeço ao prof. Brahms.

Outra imagem pseudo-mediúnica que por vezes ocorre é a de músicos vestidos de branco, com turbantes brancos, a tocar raita, ou tebel, em vários pontos de uma escarpa. Como é que eles subiram para cada ponto não sei. Seriam cerca de 20 músicos, a uma distância mínima de 5 metros entre si, tocando uma obra extremamente complexa, a nível melódico e rítmico, e dispostos verticalmente num precipício com cerca de 20 metros de altura. Aparentemente, tocam para algum convidado, gordo e importante. Quem conhecer a obra Hamza oua Hamzin (55 em árabe) dos mestres músicos de Jajouka, terá uma ideia da obra tocada nesta visão.

O nome Hamza oua Hamzin tem a ver com o facto de haver um loop rítmico com o valor de 55 semínimas, é como se fosse um compasso de 55 por 4. Nesta ordem de idéias, a obra tocada na escarpa teria o nome 237. Alguém sabe dizer 237 em árabe?

A propósito da bela espacialidade da obra 237, gostaria de lembrar que o compositor Mathias Spahlinger tem uma obra, de seu nome Furioso, em que os músicos tocam como se entrassem e saissem do palco num carrinho com rodas (um carrinho por músico), isto a nível da dinâmica. Era interessante uma obra em que os músicos se deslocassem no espaço a três dimensões. Neste sentido vale a pena ouvir concertos no Acusmonium em Paris, onde os sons são projectados a 3 dimensões. Ou pelo menos vale a pena pensar nisso!

Um abraço, em Tanit

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Aleph Trance num ritual pré islâmico

O nosso Aleph Trance foi visionado num ritual dedicado à deusa Astarté, numa cidade no norte de África. Não há qualquer registo do culto desta deusa no norte de África, o que torna este visionamento ainda mais interessante. Passamos a citar o oráculo de Hein:

"Na era na outra era era deus ou deusa o além, no vislumbre do sagrado, por trás da cortina transparente, situação Refluxus. Salud Refluxus! A deusa mãe trouxe o amor aos seus filhos no sétimo dia da colheita. Os hajim dirigiram a procissão cobertos de sedas brancas e ouro, flores ornando seus crâneos. De seguida, os eunucos da Deusa dançam o êxtase, chocalhos nas mãos, faces pintadas, saias brancas e azuis. Seguem-se os notáveis da cidade, reis dos homens e seus irmãos em Astarté, o grande Juhuba despido carregado no trono da luz pelos escravos do sol nascente. As tropas sempre sujas e ferozes, o ferro e a espada. EIA os sacerdotes trazem consigo a Deusa EIA Homens santos cobertos de folhas miram os horizontes e falam com o outro lado, ninguém lhes toca. Os músicos da confraria , cem rhaita cem tbila cantam a voz da deusa, para grande alegria do povo ABLANATHANAHTANALBA"

Esta procissão, descrita no oráculo de Hein, corresponde às visões pseudo-mediúnicas de Heinz Karlo, que, entre os gordos eunucos da deusa, vislumbrou Aleph Trance dançando em êxtase, com um sorriso louco, de óculos de armação de plástico, imagine-se! Isto algures em 600 a.c. ! Os óculos estão impossivelmente situados na ponta do nariz de Aleph, que bate um tamborim cantando "EIA EIA Asthartata" e dança com movimentos alquebrados.

É típico do nosso amigo Aleph Trance, ainda à pouco visto em situações comprometedoras com Gizelda Boulez, que agora visite um grupo de eunucos da deusa. Como diria Robert Anton Wilson: All Hail Erisia!